Gestão de pessoas não é conversa, é ciência.

Sou um curioso da gestão de pessoas. Ao longo desses anos como gestor, aprendi muito com os profissionais espetaculares de recursos humanos com quem tive a grande honra de trabalhar. Reconheço que muitas das conquistas de resultados e transformações que alcancei em minha carreira até aqui são porque consegui ter em prática um modelo prático e humano de gestão de pessoas, graças ao talento desses excelentes profissionais de recursos humanos que me acompanharam. E, com eles, a principal lição que aprendi é que gestão de pessoas não é conversa, é ciência. E não é por acaso que vemos líderes de diferentes áreas assumindo essa tarefa, inclusive engenheiros (justamente a minha origem acadêmica, por sinal).

Para mim, não existe gestão de pessoas sem foco em resultados. Se a princípio isso parece duro, devolvo a bola para você, caro leitor. Na gestão de pessoas, o indivíduo é o centro, certo? E tem resultado mais valioso do que o desenvolvimento individual, combinado com o desempenho coletivo?! Sem desempenho, não há como uma pessoa evoluir em sua vida profissional.

Ciência tem uma base empírica, correto? Logo, ela necessita de dados para definir o que está funcionando e o que precisa ser alterado. Cada vez mais, o dia a dia da gestão de pessoas tem se baseado em modelos de dados e informações concretas, e menos em opiniões e sentimentos.

Digitalização e inovação

A digitalização e a inovação também ajudam nesse sentido. Seja, por exemplo, com ferramentas robôs que ajudam em busca de perfis para seleção de pessoas, com inteligência artificial para cada vez mais alinhar o fit com a empresa, seja por meio de modelos de dados de gestão preditiva de comportamentos por meio das competências, para poder melhor posicionar cada talento nos cenários de desafio da empresa.

Como esses, são muitos os upgrades tecnológicos que os profissionais de recursos humanos têm utilizado para ajudar a guiar a gestão de pessoas de forma menos empírica e mais pragmática.

Porém, como estamos falando de ciência, precisamos de muito estudo e prática até chegar num cenário “ideal”. Alinhar expectativa de liderados é uma tarefa árdua, realmente. Não por acaso, a visão que temos de nós, gestores, nem sempre é compartilhada pelos colaboradores.

Um levantamento da consultoria de gestão Muttare identificou que, enquanto 35,1% dos líderes se veem como um coach capaz de orientar para o desenvolvimento, 19,9% dos empregados não acham o mesmo. Há uma brecha de intenção aqui, mas acredito que a principal falha esteja na comunicação, no alinhamento de expectativas e na confiança mútua.

Pessoas querem se sentir únicas, mesmo em equipes

Sei que alguns gestores não têm afinidade com essa função. Mas acontece que, com o desenvolvimento profissional, esses profissionais caminham para uma posição que exige habilidade de liderança e gestão de pessoas. E ambos podem ser aprendidos.

Desde muito jovem, tive a oportunidade e o desafio de liderar pessoas. Aos 23 anos, assumi meu primeiro cargo num nível de direção em uma empresa de médio porte, com uma equipe de cerca de 70 colaboradores.

Era a primeira vez que gerenciava um time daquele porte, e vendo aquelas pessoas trabalhando e produzindo, me veio uma grande dúvida: como liderar para tirar o melhor de cada um? Como fazer com que elas entreguem o melhor desempenho, com resultados que nem mesmo acreditavam que conseguiriam?

Com humildade, resolvi buscar exemplos e modelos para gerenciar melhor o time, já que eu via que podia fazer melhor. Foi essa curiosidade que me fez começar e nunca mais parar de estudar sobre as técnicas de gestão de pessoas. Sou um admirador dos profissionais dessa área, mas não sou técnico, então, não cabe a mim falar de ferramentas, nem deixar um “como fazer”, mas vou continuar abordando minha visão e meus aprendizados como líder.

Objetivos como foco na gestão de pessoas

O raciocínio que tem me guiado ao longo desses anos é que todos nós temos propósitos de vida que incluem questões pessoais e profissionais. E, como líder, vale alinhar esses propósitos proporcionais com os da equipe. Simples, mas na prática é desafiador.

Quando nos aliamos a uma empresa e aceitamos fazer parte de um objetivo, alcançá-lo de forma individual e coletiva deve ser importante para a nossa evolução profissional. É por isso que acredito na criação de sistemas de gestão de pessoas focados no resultado delas e, consequentemente, da empresa. Isso, para mim, é fundamental para alinhamento da parte prática do propósito.

Pessoas inteligentes e competentes gostam e precisam ser desafiadas e fazer parte de um coletivo que seja eficiente. Em minha experiência executiva, a criação de sistemas focados e desafiadores para todos, em equipes de alto desempenho, é um ponto importante para a retenção de pessoas diferenciadas. Indivíduos competentes querem alcançar resultados competentes com líderes que os fazem ser melhores a cada dia.

O líder deve assumir um papel de dar o norte, de motivar justamente por esse propósito, criar tração e energia para que as pessoas queiram fazer. A entrega tem total relação com o compromisso com resultados, com as metas e, claro, com a soma do ambiente e da confiança transmitida e oferecida por líderes.

Compreensão da profundidade dos negócios

A curiosidade da gestão de pessoas envolve também uma compreensão profunda sobre o negócio e como o fator humano se direciona aos resultados dele. Nessa hora, percebo como turva a visão única de que colaboradores são custos, uma vez que, se alinhados aos propósitos da empresa, são ativos que geram lucratividade.

Como em cada célula da empresa o fator humano afeta a lucratividade da empresa? Como as pessoas podem contribuir mais? Para ser efetiva a gestão de pessoas, é necessário combinar o conhecimento do negócio com a expertise dos colaboradores e suas competências.

É preciso considerar que, se gerenciados de forma proativa, levarão a um maior resultado. Bons profissionais de recursos humanos aportam valor ao corretamente definir e otimizar fatores humanos mais relevantes nos direcionadores de resultados das empresas.

Gestão de pessoas em tempos de covid-19

A função do líder também precisa ser debatida dentro de um contexto em que a gestão de pessoas passa pelo remoto, como consequência da pandemia de covid-19.

São muitas transformações em pouco tempo, e o gestor precisa ter habilidade para dar acolhimento, atenção, tranquilidade e, por outro lado, conseguir que as equipes realizem o necessário, em condições completamente diferentes.

Sentimentos de medo e incerteza, além das restrições de circulação, e mil desafios ao líder, merecem um artigo à parte, e compartilho aqui o que escrevi sobre desafios de liderança.

Gestão de pessoas dentro das muitas transformações

No cenário atual, vale mencionar alguns dos papéis do gestor. O primeiro seria a adequação do ambiente físico, isto é, de ajudar nas adaptações das instalações de trabalho (em casos que não comportam trabalho remoto). Não basta colocar um vidro de álcool em gel na recepção. É preciso avaliar, de forma real, a organização do espaço, de cada estação de trabalho, das distâncias, dos processos, dos fluxos, de forma a garantir que a performance seja fluida e segura.

Por outro lado, entra em cena a gestão de equipes em trabalho remoto. Temos ferramentas digitais que permitem isso, mas adaptação é uma palavra de honra. Não podemos presumir que todos os colaboradores dominam toda e qualquer plataforma. É necessário prestar as devidas formações e gerenciar para garantir um ambiente digital saudável e produtivo.

As pessoas sentem falta do contato, da conversa, da interação. E, como falei acima, cada um quer ser tratado como único, ainda que seja em equipe. Nesse momento, a gestão de pessoas é fundamental e pode orientar os gestores sobre boas práticas para esses encontros. Gestores precisam ser inclusivos, tomar um cuidado extra que todos participem, por exemplo evitando fazer somente perguntas abertas a todos.

Mas o líder que entra numa sala virtual com 30 pessoas e acredita que está tudo bem porque ninguém falou o contrário, está fazendo seu papel pela metade. Manter os encontros 1 a 1, a preocupação genuína, ainda mais nesse momento de apreensão, é primordial para o bem-estar e o desempenho do colaborador.

São muitas tensões e novos sentimentos que surgem com a pandemia. O outro ponto que merece destaque na gestão de pessoas é a preocupação com a saúde mental dos profissionais, pois está claro que a empresa invadiu a vida particular de todos quase por 24 horas. O sentimento de sobrecarga e fadiga mental é grande.

Necessitamos mesma dessa reunião? As pessoas estão conseguindo desligar, desconectar, descansar quando preciso? São novos cuidados nessa nova realidade.

Comunicação e confiança são primordiais

O contato próximo entre líderes e liderados precisa ser uma relação de confiança, algo que só é obtido por meio da comunicação, essa mesmo que eu disse logo acima. Essa compreensão, essa empatia tão poderosa permitida pelas reuniões individuais.

A gestão de pessoas está sempre ligada à comunicação, hoje especialmente. Com essa ferramenta, podemos trabalhar a agilidade, a transparência e a horizontalidade na comunicação corporativa.

E, assim, posso falar sobre a difícil tarefa que é tomar decisões quando o fator humano está envolvido. O papel do líder passa pela tomada de decisões duras, que precisam ser mais objetivas, e menos opinativas. Isso é, quando falamos de embasar escolhas empresariais, não podemos pensar somente em opiniões e achismos. Precisamos de dados e, claro, dos resultados.

Percebo que hoje, cada vez mais, as empresas e os líderes têm repensado o papel na sociedade, com visões de como podem contribuir, no curto e/ou no longo prazo, com pequenas ações ou grandes transformações. Como estamos e estaremos em transformação constante, a gestão de pessoas é uma das principais ferramentas para essa suportar aos líderes nessa transformação.

AUTOR: MARCELO MIRANDA. Executivo e empreendedor, Engenheiro Civil formado pela UFMG, com MBA em Stanford e cursos de especialização em Harvard, Columbia e Singularity University. CEO da Consolis Tecnyconta na Espanha, filial espanhola do grupo multinacional francês Consolis, líder em pré-fabricados de concreto na Europa. 

Fonte: https://administradores.com.br/artigos/gest%C3%A3o-de-pessoas-n%C3%A3o-%C3%A9-conversa-%C3%A9-ci%C3%AAncia

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